Desigualdade de acesso marca aniversário dos direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário

Banheiro construído por https://www.somossana.org/
Banheiro construído por https://www.somossana.org/

Brasil avança lentamente rumo ao cumprimento dos DHAES, mesmo após 12 anos de reconhecimento pela ONU

Lavar as mãos, beber água limpa, tomar banho, dar descarga no banheiro. São tarefas cotidianas e simples que nem todas as pessoas conseguem realizar diariamente ou com facilidade. Na semana em que se comemora 12 anos do reconhecimento pela ONU dos Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário (DHAES), o Instituto Água e Saneamento (IAS) alerta para a falta de acesso adequado. Quase metade da população brasileira não conta com serviços de coleta e tratamento de esgoto e 16% não têm abastecimento de água.

Em comemoração ao aniversário dos DHAES, o IAS divulgou uma série de entrevistas com os relatores especiais da ONU para os Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário. A primeira relatora, Catarina de Albuquerque, destacou o papel das mulheres na luta por saneamento e contou como foi acompanhar de perto o reconhecimento do DHAES pela ONU. Léo Heller, segundo relator, abordou a importância de investir esforços para o acesso ao esgotamento sanitário e como isso motivou a ONU a reconhecer, em 2015, os DHAES como distintos. O atual relator, Pedro Arrojo, falou sobre os atuais desafios para a universalização do acesso.

Os DHAES foram reconhecidos em 28 de julho de 2010. Naquele ano, de acordo com o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), 46,2% da população brasileira era atendida com rede de esgoto e 81,1% com rede de água. Dez anos depois, o crescimento do índice de atendidos foi muito baixo – passou para 55% e 84,1% respectivamente. 

Caso o ritmo de ampliação se mantenha, é improvável alcançar a meta do novo Marco Legal do Saneamento, de garantir acesso a 99% da população à água e 90% a esgotamento sanitário até 2033. O Brasil também é signatário dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e se comprometeu a “assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todas as pessoas” até 2030.

Os dados do SNIS consideram apenas se a pessoa habita uma área onde há rede pública dos serviços de abastecimento de água e/ou esgotamento sanitário, o que não  garante real acesso e atende apenas a um dos critérios de avaliação dos DHAES: o da disponibilidade. Os demais critérios – qualidade e segurança, acessibilidades física e financeira, aceitabilidade e, no caso do esgotamento sanitário, privacidade e dignidade – ficam de fora dos indicadores.

“O avanço rumo à universalização com base nos DHAES deve buscar uma realização mais horizontal, de forma a diminuir as desigualdades de acesso. Deve ser dada a priorização de investimentos que busquem um patamar que equilibre a qualidade do serviço e a ampliação de atendimento dos locais menos assistidos e com concentração de populações mais vulneráveis em termos econômicos, sociais e de saúde” ressalta a especialista em Políticas Públicas e Planejamento Urbano do IAS, Paula Pollini.

Populações negras, pessoas que moram em favelas, povos indígenas e outros grupos sociais vítimas do racismo ambiental estão entre os sem acesso. O problema ganha proporções ainda maiores devido à emergência climática.

O que significa, na prática, garantir os Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário?

Não adianta apenas ter rede de água em casa. O acesso deve ser contínuo (sem intermitências), com quantidade suficiente para os usos pessoais e domésticos (beber e cozinhar, lavar roupa, disposição dos dejetos e higiene pessoal e doméstica). A água precisa ser adequada para consumo e outros usos. O valor a ser pago pelo serviços também deve ser adequado à renda da população e deve haver o direito a um fluxo mínimo de água mesmo em caso de inadimplência no pagamento.

O esgotamento sanitário, por sua vez, deve ser seguro do ponto de vista higiênico e técnico. Para a higiene, é essencial ter acesso à água para a limpeza e a lavagem das mãos. Além disso, as instalações devem ser aceitáveis do ponto de vista cultural, com atenção às especificidades de gênero quanto à intimidade, segurança e dignidade. 

O abastecimento deve ser suficiente, seguro, aceitável e acessível nas proximidades dos domicílios, escolas, centros de saúde e outras instituições e lugares públicos. A segurança física, especialmente das mulheres e crianças, deve ser assegurada durante o acesso aos serviços, que precisam contar com instalações apropriadas.

Serviços e instalações de água devem estar ao alcance de todos, todas e todes, com custos e encargos diretos e indiretos acessíveis, sem comprometer o exercício de outros direitos humanos.

Monitoramento dos avanços

O IAS também realiza o monitoramento constante dos avanços do saneamento, incluindo informações sobre os processos de regionalização nos estados e municípios, além de indicadores, por meio das ferramentas Municípios e Saneamento e Painel do Marco Legal do Saneamento. Conheça aqui.